sexta-feira, 27 de setembro de 2013

As estratégias utilizadas pelos membros de famílias para influenciar o processo de compra familiar

2. Referencial Teórico
A contextualização do presente trabalho se dá a partir da discussão de pontos fundamentais para a compreensão do comportamento do consumo familiar. Dessa forma, serão apresentadas algumas concepções do papel do adolescente na decisão de compra familiar e dos tipos de abordagens existentes para exercício da influência na decisão de compra familiar.
2.1 Comportamento de compra familiar
O comportamento de compra da família é um processo coletivo, visto que ocorre, quando há dois ou mais indivíduos envolvidos na tomada de decisão. Nesse processo os participantes não se limitam à simples busca de informações; valem-se também da troca de opiniões e participação ativa.
Belch e Willis (2002) e Jenkins (1980) afirmam que os estrategistas de marketing têmse preocupado em saber quais membros da família têm mais influência nos vários tipos de decisão. Segundo os autores, identificar o nível de influência de cada membro da família para determinados produtos, em dada situação, pode influenciar as estratégias de marketing a serem utilizadas.
Burns e Granbois (1980) e Davis (1976) destacam que a tomada de decisão na família, em muitos estudos realizados, era considerada somente com a opinião do marido e da esposa.
Hoje, contudo, o adolescente apresenta papel fundamental na decisão, inclusive influenciando ativamente a escolha (Beatty e Talpade, 1994; Dubois, 1998; Jenkins, 1980; e Szybillo e Sosanie, 1977).
Segundo Spiro (1983), muito da compreensão do comportamento de compra da família desenvolveu-se a partir dos estudos de joint decision-making. “Uma grande porção das decisões importantes das famílias são tomadas em conjunto, por pelo menos dois membros da família” (Corfman, 1989).
O nível de importância e uso do produto também estão diretamente relacionadas à percepção de influência (Foxman e Tansuhaj, 1988). Segundo os autores, a influência dos membros da família é distinguida por usuário do produto, sejam produtos para as crianças, para os pais ou para toda a família.
Apoiando-se sobre a tese da tomada de decisão familiar, Davis (1976) entende que o mais importante é saber a concepção de como são tomadas as decisões. O mesmo autor observa que medir o resultado da decisão, quem decide ou quem venceu a decisão, é diferente de medir o processo de decisão: quem inicia o processo de decisão, o interrompe ou como é realizado o processo de influência.
2.2 O papel do adolescente na decisão de compra familiar
O poder de compra dos adolescentes tem crescido dramaticamente nos últimos anos, representando um particular grupo de consumidores (Bristol, 2001; Corfman, 1997). Ainda segundo Bristol (2001), é importante para os pesquisadores de consumo entenderem o comportamento do adolescente no mundo do consumo, dentro ou fora do contexto da família.
Para Myers e Reynolds (1972, p. 281):
O papel dos filhos nas decisões de compra varia muito de família para família, desde um extremo ao outro. Há famílias em que os filhos nada podem dizer. Há os casos intermediários em que os filhos opinam sobre as compras de comida, roupas e brinquedos (daquilo que participam diretamente). Há também famílias onde os filhos influenciam de modo decisivo, na compra de bens duráveis, como carros, aparelhos de televisão colorida e até mesmo na compra da casa.
Segundo McNeal (1992), com os pais trabalhando fora do domicílio, o acréscimo na renda familiar permite aos pais gastarem mais dinheiro com os filhos. Pelo fato de os pais terem cada vez menos tempo para os filhos, levados por um sentimento de culpa por não dedicarem tanto tempo aos filhos, acabam usando o dinheiro extra que ganham para comprar mais itens para eles. Os pais que trabalham fora tendem a pedir aos filhos que participem das atividades da casa, fazendo com que os jovens passem a assumir o controle do consumo mais cedo e provavelmente com menor idade.
De acordo com Foxman e Tansuhaj (1988), nos produtos em que o filho está diretamente envolvido, ele tende a exercer mais influência na decisão de compra. “Os adolescentes têm menos influência nas decisões de produtos para o uso dos pais” (Foxman e Tansuhaj, 1988, p. 451).
Assim, o adolescente passa à condição de influenciador e importante fonte de informação para as decisões da família, por já estar em uma faixa de idade capaz de opinar sobre conhecimentos econômicos e habilidades de consumo, e que os pais lhe creditam chances de participar da decisão de compra familiar, dando-lhes atenção. Para Beatty e Talpade (1994) e Mehrotra e Torges (1977), a idade do filho e o tipo de produto a ser adquirido é fator decisivo da sua participação. “Crianças mais velhas têm mais sucessos nas tentativas de influenciar os pais” (Mehrotra e Torges, 1977, p. 56).
Schiffman e Kanuk (2000) entendem que os adolescentes influenciam a compra da família. Para os autores, os adolescentes influenciam as compras de seus pais, quando vão às compras com eles; quando sugerem suas marcas preferidas, mesmo quando não estão comprando com os pais; quando os pais buscam seus conselhos; e quando lhes pedem opinião de um presente.
Foxman, Tansuhaj, Ekstrom (1989), por sua vez, em pesquisa survey, demonstram que o adolescente influencia uma variedade de produtos: férias e viagens (60%); assinatura de revistas (55%); videocassete (47%); equipamentos de som estéreo (37%); Moschis e Churchill Jr. (1979), ao analisarem o comportamento de consumo do adolescente, examinam as diferentes habilidades de consumo que o adolescente têm, de acordo com fatores socioeconômicos, idade e gênero. Segundo os autores, os adolescentes mais velhos têm maior conhecimento de consumo e são mais capazes de diferenciar cognitivamente as informações sobre os atributos dos produtos nas propagandas, gerirem melhor as finanças e além de realizarem busca de informações em várias fontes de pesquisa, diferentemente dos consumidores mais jovens. Os adolescentes mais novos têm atitudes mais favoráveis às propagandas e preços do que adolescentes mais velhos.
Os resultados do estudo também apontaram para o esclarecimento de que o comportamento de consumo do adolescente pode ser influenciado não somente por fatores como o estrato socioeconômico, idade e gênero. O adolescente de certa faixa social tem maior motivação econômica para o consumo do que de outra. Assim, as comunicações de marketing tendem a ser mais eficazes quando direcionadas a adolescentes de classe média do que aos de classe baixa (Moschis e Churchill Jr., 1979).
No processo de decisão de compra familiar, o adolescente sempre tenta influenciar a decisão de compra por meio de uma variedade de estratégias (Corfman, 1997), estas chamadas de estratégias de influência.
2.3 Tipos de Abordagens para exercício da Influência
Influência é uma ação tomada por uma pessoa para que a outra prefira a sua decisão
(Qualls, 1988). A definição de influência varia de uma pessoa para a outra. Algumas percebem somente a dimensão ativa da palavra, outras percebem os dois sentidos da palavra (ativa e passiva) (Jenkins, 1979). A dimensão ativa da influência refere-se quando o consumidor é questionado sobre a preferência de algo. E a dimensão passiva é quando, por exemplo, durante a compra familiar, a mãe compra vários produtos, até perceber qual o gosto do filho. Desta maneira o filho influencia passivamente a mãe.
O nível de influência dos membros da família é determinado pelo nível individual de importância do produto, pelo nível de envolvimento (Qualls, 1988) e conhecimento dos consumidores (Engel, Blackwell e Miniard, 2000).
No comportamento de compra familiar, diferentes tipos de abordagens são utilizadas para influenciar a opinião daqueles que têm o poder de decisão do processo. Davis (1974) destaca que, durante a tomada de decisão conjunta, como no exemplo da família, as decisões podem ser consensuais ou acomodativas, onde os membros concordam com o objeto de compra.
Segundo Qualls (1988), um dos resultados do aumento das decisões familiares conjuntas têm sido o potencial de conflitos entre os membros. Os membros da família concordam que nem sempre é possível conciliar todas as preferências de consumo, gerando-se conflitos (Davis, 1974). O conflito é conceituado como: “um desacordo entre os membros da família com relação aos objetivos de compra da família, as alternativas de decisão, ou ao processo decisório como um todo” (Qualls, 1988, p. 443).
Visando à solução desses conflitos, os membros da família atendem às expectativas da família, buscando uma solução aceitável para eles (Davis, 1974). Para alcançar uma solução aceitável estabelecida, os membros utilizam diversos tipos de abordagens para influenciar os demais membros da família. Diversos autores, a exemplo de Belch, Belch e Sciglimpaglia (1980), Bristol (2001), Davis (1974, 1976), Palan (2001), Palan e Wilkes (1997), Qualls (1988), Schiffman e Kanuk (2000) e Spiro (1983), definem estas abordagens como estratégias de influência.
Durante o período de decisão de compra familiar, em que as várias alternativas são consideradas, cada cônjuge tenta influenciar o outro pela sua decisão preferida (Spiro, 1983).
Quando os objetivos entram em conflito, os cônjuges utilizam uma variedade de técnicas de influência, a depender das suas próprias características e daquelas do indivíduo que quer influenciar (Davis, 1974; Spiro, 1983).
Os autores (Belch, Belch e Sciglimpaglia, 1980; Davis, 1974, 1976; Palan, 2001;
Palan e Wilkes, 1997; Qualls, 1988; Spiro, 1983) que tratam do gerenciamento do conflito das decisões familiares apontam que as abordagens podem ser dividas segundo o tipo de usuário das estratégias de influência.
Schiffman e Kanuk (2000), Spiro (1983) e Qualls (1988) identificam seis tipos de estratégias de influência para resolver conflitos entre maridos e esposas em relação ao consumo, a seguir indicadas.
1. Especialista: tentativa de um cônjuge usar seu conhecimento a respeito das alternativas de decisão para influenciar o outro. Um cônjuge tenta convencer o parceiro, demonstrando conhecimento específico do produto em consideração; apresentando, por exemplo, detalhes de informações dos aspectos do produto.
2. Legitimidade: tentativa de um cônjuge influenciar o outro com base na sua posição dentro de casa. “O marido pode argumentar já que ele é o ‘homem da casa’, ele deveria tomar a decisão” (Spiro, 1983, p. 394).
3. Barganha: tentativa de um cônjuge garantir uma influência que será trocada no futuro. Segundo Spiro (1983), o cônjuge oferece um retorno garantido para o parceiro: se você fizer isso, eu farei aquilo.
4. Recompensa: tentativa de um cônjuge influenciar o comportamento do outro por meio de recompensa. Spiro (1983) esclarece que, neste tipo de influência, o cônjuge pode ser bastante carinhoso, podendo comprar um presente para o outro objetivando antecipar o exercício da influência.
5. Emocional: tentativa de um cônjuge utilizar a emoção para influenciar o comportamento do outro. Para Spiro (1983), geralmente as técnicas desta estratégia são não-verbais, um membro pode ficar chateado com outro, chorar ou preferir o silêncio.
6. Administrar as impressões: qualquer tentativa de persuasão de um cônjuge para influenciar o comportamento do outro. “Um cônjuge diz ao parceiro que a marca preferida não havia em estoque, quando na verdade ainda existia” (Spiro, 1983, p.394).
Similarmente, Belch, Belch e Sciglimpaglia (1980), agrupam as abordagens para exercício da influência em 3 grupos: solução de problema, barganha e persuasão (ver tabela 01).
TABELA 01 – ESTRATÉGIAS PARA SOLUÇÃO DE CONFLITOS FAMILIARES
Solução de Problema:
1 - Reunir mais informações antes de tomar a decisão
2 - Discussão familiar do problema
3 - Quando tem um membro da família com mais conhecimento para resolver o problema.
Barganha:
4 - É realizada uma promessa por uma consideração futura para que o membro da família concorde com a escolha.
5 - Retardar a decisão
Persuasão:
6 - Forma-se uma coalizão entre dois ou mais membros da família para convencer o indivíduo a concordar com a escolha.
7 - Exercício da autoridade com uma parte dos membros da família.
FONTE: BELCH, Michael A.; BELCH, George E.; SCIGLIMPAGLIA, Donald. Conflict in Family Decision
Making: An Exploratory Investigation. Advances in Consumer Research, vol. 7 num. 1, p. 475, 1980.
A abordagem de solução de problema é vista como forma comum de solução de conflito familiar (Belch, Belch e Sciglimpaglia, 1980). Ainda segundo os autores, nesse caso o conflito é conseqüência de desacordos com as opiniões dos membros da família, mais que por motivos próprios para a compra.
Na barganha há desacordo fixo entre os membros da família sobre os motivos das compras. Para Belch, Belch e Sciglimpaglia (1980), esta abordagem envolve longas considerações, em que os membros das famílias estão dispostos a fazer sacrifício para certa decisão.
A persuasão envolve convencer um membro da família a tomar uma decisão que ele/ela não tomaria independentemente (Belch, Belch e Sciglimpaglia, 1980). Segundo os autores, nesta abordagem existem desacordos com relação às subdecisões do processo decisório, em que os membros buscam interagir entre si para resolver o conflito, sem, contudo, adquirir novas informações. A abordagem inclui uma variedade de métodos, tais como crítica, intuição, coerção e coalizão.
O estudo de Belch, Belch e Sciglimpaglia (1980) difere de outras investigações quanto à tomada de decisão de compra familiar, por considerar a percepção da criança, juntamente com a do marido e da esposa. Seus resultados comprovam que o percentual de desacordo percebido entre os membros é maior em automóveis e viagens de férias, visto que são dois tipos de produtos em que os membros participam diretamente do consumo.
A abordagem de solução de problema, detalhada conforme a tabela 07 acima, foi empregada por Belch, Belch e Sciglimpaglia (1980) para quase todos os produtos da pesquisa realizada, com a exceção somente do cereal para café da manhã, que teve a persuasão no sentido do exercício da autoridade como a principal abordagem utilizada. A barganha, no sentido de promessas por considerações futuras e no retardo da decisão, e a estratégia de persuasão, no que se refere à coalizão entre membros, foram destacadas como abordagens pouco utilizadas pelos membros entre os produtos pesquisados. Por fim, Belch, Belch e Sciglimpaglia (1980) demonstraram, por meio dos resultados empíricos, que os membros da família concordam que a abordagem mais utilizada é solução de problema, seguida da persuasão e barganha.
Palan e Wilkes (1997) também buscaram expandir o conhecimento do processo de compra familiar, mudando o foco de influência de pais para interações de pais e adolescentes, explorando as estratégias usadas por adolescentes para influenciar decisão familiar de compra e as respostas dos pais em face dessas estratégias; e a efetividade percebida dessas estratégias (tabela 02). Os autores, a partir da análise de conteúdo, definindo e refinando as categorias de análise, e da análise interpretativa classificaram em grupos as estratégias utilizadas pelos pais e adolescentes. Dentre as abordagens utilizadas por ambos para o exercício da influência estão a barganha, a persuasão e a emotividade; pelo adolescente, a estratégia de pedido; e basicamente pelos pais, estão a experiência, legitimidade e o direcionamento.

Segundo os autores, cada abordagem é definida conforme sua idéia central. Na abordagem da barganha os acordos entre membros da família são baseados em trocas e concessões: em dinheiro; outras formas, como no exemplo de quando o filho faz algum trabalho doméstico em troca do objeto desejado, ou ainda por argumentações sobre ganhos mútuos em se efetuar determinada compra. A abordagem da persuasão consiste no convencimento do interlocutor familiar em decidir a favor de um membro da família. A abordagem da emotividade envolve o uso intencional da emoção na tentativa de influenciar o processo de decisão de compra, podendo envolver situações de choro e raiva. A abordagem de pedido consiste em simplesmente pedir um objeto desejado ou ainda expressar o desejo ou a necessidade daquilo que se quer. A abordagem de experiência é aquela em que os pais se valem do conhecimento e experiência para influenciar seus filhos, ensinando-lhes a fazer compras de forma a ponderar qualidade, valor real e economia. A abordagem da legitimidadeconsiste em utilizar a legitimidade e a autoridade que os pais têm sobre seus filhos no sentido de determinar as decisões de consumo. Na abordagem de direcionamento, similarmente à legitimidade, busca-se influenciar as decisões de consumo, com aconselhamentos utilizados a partir da legitimidade que os pais têm com seus filhos.
Ainda nesse sentido, Palan (2001) estende a compreensão de como e por que o adolescente adquire e utiliza as abordagens de influência de decisão de compra no contexto da família. Para facilitar a análise dos dados em seu estudo, as estratégias dos pais e das crianças foram agrupadas pelo autor em grupos de estratégias por meio da análise fatorial. As abordagens paternais foram de discussão, dar opiniões, pedir opiniões, precisar versus querer, alternativa, argumentação, determinar parâmetros, ensinar habilidade/técnica; de barganha, acordos monetários e outros acordos; e de autoridade, resposta simples, não ter dinheiro para isto, retardar. As abordagens utilizadas pelos adolescentes foramnegativas, persistência, raiva, choro, queixar-se, manipular; de persuasão, como conversa suave, pedido, todos os outros possuem; de argumentação, argumentação, acordo monetário e outros acordos; de comunicação, pedido, contar/dizer.


5. Considerações Finais


Os resultados deste trabalho comprovam que os membros da família diferem as suas percepções de quais estratégias de influência melhor funcionariam em uma resolução de conflito familiar. A pesquisa evidencia que os pais utilizam, prioritariamente, as estratégias de discussão e autoridade e os adolescentes utilizam discussão,persuasão e emoção para convencer os demais membros da família quanto à sua escolha preferida no processo de compra familiar. A estratégia de barganha foi destacada como abordagem tanto paternal como dos adolescentes.
Além disso, as análises dos resultados demonstraram que as características sociodemográficas (gênero, idade, estrato socioeconômico e tempo no trabalho) e característica cognitiva (nível de conhecimento do consumidor) afetam as estratégias de influência utilizadas pelos membros da família.

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